Prévio:  Fernando Pessoa   Superior:  Pratica   Próximo:  Sobrenomes brasileiros

 

Contos do nascer da Terra

Cumpre-me antes que nada salientar que Mia Couto gosta de criar palabras, e é un mestre nestes mesteres. Asi que, ante palabras como idimensão (idimensión), ou minhocar (miñocar), non serven os dicionários, senón a imaxinación.

CONTOS DO NASCER DA TERRA   CONTOS DO NASCER/NACER DA TERRA
  • Nota: Grupo sc medial. Polo que se refire a conservación ou a desaparición do grupo latino sc, a normativa de mínimos segue o modelo do portugués, encanto as NOMIG(1997) prefiren o modelo do castelán.

    1. Nos cultismos ambas normativas prescreben conservar o grupo. Ex: adolescente, condescender, discernir, plebiscito ...

    2. Nas palabras patrimoniais a normativa de mínimos prescrebe conservar o grupo, e as NOMIG(97) reduci-lo a c. Ex: nascer (nacer), néscio (necio), crescer (crecer).

    Note-se que nas zonas seseantes este grupo é equivalente a ss, que se pronúncia como un s normal.

   

Não é da luz do sol que carecemos. Milenarmente a grande estrela ilumina a terra e, afinal, nós pouco aprendemos a ver. O mundo necessita ser visto sob outra luz: a luz do luar, essa claridade que cai com respeito e delicadeza. Só o luar revela o lado feminino dos seres. Só a lua revela intimidade da nossa morada terrestre.
Necessitamos não do nascer do Sol. Carecemos do nascer da Terra.

 

Non é da luz do sol que carecemos. Milenarmente a grande estrela ilumina a terra e, afinal, nós pouco aprendemos a ver. O mundo necesita ser visto sob/so outra luz: a luz do luar, esa claridade que cai con respeito e delicadeza. Só o luar revela o lado feminino dos seres. Só a lua revela intimidade da nosa morada terrestre.
Necesitamos non do nascer/nacer do Sol. Carecemos do nascer/nacer da Terra.

 
   

O não desaparecimento de Maria Sombrinha

Afinal, quantos lados tem o mundo no
parecer dos olhos do camaleão.

 

O non desaparecimento de Maria Sombriña

Afinal, cantos/cuantos lados ten o mundo
no parecer dos ollos do camaleón.

 
   

Já muita coisa foi vista neste mundo. Mas nunca se encontrou nada mais triste que caixão pequenino. Pense-se, antemanualmente, que esta estória arrisca conter morte de criança. Veremos a verdade dessa tristeza. Como diz o camaleão - em frente para apanhar o que ficou para trás.

 

Xa muita cousa foi vista neste mundo. Mas nunca se encontrou nada mais triste que caixón pequeniño. Pense-se, antemanualmente, que esta estória arrisca conter morte de crianza. Veremos a verdade desa tristeza. Como diz o camaleón - en frente para apañar o que ficou para trás.

 

  • Nota: criança = neno ou nena.

  • Nota: coisa -> cousa. Ainda que en portugués pode-se dicer tanto cousa como coisa, está última é con moito a forma mais usual na actualidade.

  • Nota: antemanualmente (antemanualmente) é una criazón do autor. Eu interpreto que ven de "de antemán".

   

Deu-se o caso numa família pobre, tão pobre que nem tinha doenças. Dessas em que se morre mesmo saudável. Não sendo pois espantável que esta narração acabe em luto. Em todo o mundo, os pobres têm essa estranha mania de morrerem muito. Um dos mistérios dos lares famintos é falecerem tantos parentes e a família aumentar cada vez mais. Adiante, diria o camaleonino réptil.

 

Deu-se o caso nunha família pobre, tan pobre que nen tiña doenzas. Desas en que se morre mesmo saudábel. Non sendo pois espantábel que esta narración acabe en luto. En todo o mundo, os pobres teñen/ten/tein esa estraña mania de morreren muito. Un dos mistérios dos lares famintos é faleceren tantos parentes e a família aumentar cada vez mais. Adiante, diria o camaleonino réptil.

 

  • Nota: Têm (teñen/ten/tein) é a terceira persoa do plural do presente do verbo ter (ter), encanto a terceira persoa do singular é tem (ten), i.e. ambas persoas diferencian-se unicamente na abertura da vogal. Esta proximidade deu lugar en galego a aparición da forma analóxica teñen, que se espallou na maior parte da Galiza, convivindo coas formas mais tradicionais ten, con vogal fechada, e tein. Este fenómeno tamén ocorre en portugués, non sendo inusual na fala, que non na escrita, a forma tenhem.

 

 

 

A família de Maria Sombrinha vivia em tais misérias, que nem queria saber de dinheiro. A moeda é o grão de areia esfluindo entre os dedos?. Pois, ali, nem dedos. Tudo começou com o pai de Sombrinha. Ele se sentou, uma noite, à cabeceira da mesa. Fez as rezas e olhou o tampo vazio.

 

A família de Maria Sombriña vivia en tais misérias, que nen queria saber de diñeiro. A moeda é o gran/grao de area/areia esfluindo entre os dedos?. Pois, ali, nen dedos. Todo comezou co pai de Sombriña. El se sentou, unha noite, á cabeceira da mesa. Fixo/fizo as rezas e ollou o tampo vacio.

 

  • Nota: Esfluindo é unha criazón do autor derivado de fluir (fluir).

  • Nota: En portugués diferencia-se entre tudo e todo:

    • todo, adx. e pron. indef. inteiro; completo; íntegro; total; calquer; cada; o maior; s.m. conxunto; soma; universalidade; aspeito xeral.

    • tudo, pron. indef. inv. a totalidade das persoas ou cousas de que se trata; o esencial, o indispensábel.

  • Nota: No portugués escrito non é obrigatória nen usual a contracción da preposición com e o artigo o (co). Cousa que si ocorre en galego. Vexa-se a nota sobre contraccións.

  • Nota: En portugués o pronome persoal masculino da terceira persoa escrebe-se: ele (el).

  • Nota: En portugués a terceira persoa de singular do preterito perfeito do verbo fazer (facer) é fez. En galego usan-se duas formas, fixo, a mais espallada, e fizo, minoritária.

 

 

 

- Eh pá, esta mesa está diminuir! Os outros, em silêncio, balancearam a cabeça, em hipótese. - Vocês não estão a ver? Qualquer dia não temos onde comer. Ao se preparar para dormir, apontou o leito e chamou a mulher: - Esta cama cada dia está mais pequena. Um dia desses não tenho onde deitar.

Debateram o assunto, timidamente, com o pai. Sugeriram que a razão pudesse ser inversa: o mundo é que estava a aumentar, encurralando a aldeiazinha. Fosse o caso dessa suposição, a aldeia estaria metida em vara de sete camisas. Mas o velho não arredou ideia. Casmurrou contra argumento alheio, ancorado na teima dele.

 

- Eh pá, esta mesa está diminuir! Os outros, en siléncio, balancearon a cabeza, en hipótese. - Vostés non están a ver? Calquer dia non temos onde comer. Ao se preparar para dormir, apontou o leito e chamou a muller: - Esta cama cada dia está máis pequena. Un dia deses non teño onde deitar.

Debateron o asunto, timidamente, co pai. Suxeriron que a razón pudese ser inversa: o mundo é que estaba a aumentar, encurralando a aldeaziña. Fose o caso desa suposición, a aldea estaria metida en vara de sete camisas. Mais o vello non arredou idea. Casmurrou contra argumento alleo, ancorado na teima del.

 

  • Nota: A tradución mais imediata de vocês é vostés/vostedes. Mais cumpre sinalar que en portugués você non é usualmente un tratamento de respeito. Asi no Brasil é equivalente a tu (tu/ti), praticamente desaparecido da língua popular, e actualmente en Portugal soa despreciativo, i.e. tratar a alguén de você é considerá-lo inferior. Non sei cal é a situación en Mozambique, mais neste caso unha tradución correcta da frase Vocês não estão a ver? parece-me: Vós non estades a ver?

 

 

 

Por fim, sua visão minguante aconteceu com Sombrinha. Ele via o tamanho dela se acanhar, mais e mais pequenita. E se queixava, pressentimental:

- Esta menina está-se a enxugar no poente ...

Todos se riam. O pai cada vez piorava. Face ao riso, o homem se remeteu à ausência. Se transferiu para as traseiras, se anichou entre desperdício e desembrulhos. A filha ainda solicitou comparência do mais velho.

- Deixe o seu pai. Lá onde está, ele não está em lugar nenhum.

Valia a pena sombrear a miúda, minhocar-lhe o juízo? Mas Sombrinha não deixou de rimar com a alegria. Afinal, era ainda menos que adolescente, dada somente a brincriações. Sendo ainda tão menina, contudo, um certo dia ela se barrigou, carregada de outrem. Noutros termos: ela se apresentou grávida. Nove meses depois se estreava a mãe. Sem ter idade para ser filha como podia desempenhar maternidades?.

 

Por fin, a sua visión minguante aconteceu con Sombriña. El via o tamaño dela se acañar, mais e mais pequeniña. E se queixaba, presentimental:

- Esta meniña está-se a enxugar no poente ...

Todos se rian. O pai cada vez pioraba. Face ao riso, o home se remeteu á auséncia. Se transferiu para as traseiras, se anichou entre desperdício e desembrullos. A filla ainda solicitou comparéncia do mais vello.

- Deixe o seu pai. Lá onde está, ele non está em lugar nengun.

Valia a pena sombrear a miúda, miñocar-lle o xuízo? Mais Sombriña non deixou de rimar coa alegria. Afinal, era ainda menos que adolescente, dada somente a brincriacións. Sendo ainda tan meniña, contodo, un certo dia ela se barrigou, carregada de outren. Noutros termos: ela se apresentou grávida. Nove meses depois se estreaba a mai. Sen ter idade para ser filla como podia desempeñar maternidades?

  • mãe -> mai

  • Nota: O pronome indefinido portugués nenhum corresponde-se coa forma galega nengun/ningun (mínimos/NOMIG).

  • Nota: pressentimental, minhocar, brincriações (brincar + criações) e barrigar son criazóns de Mia Couto.

 

 

 

A criancinha nasceu, de simples escorregão, tão minusculinha que era. A menina pesava tão nada que a mãe se esquecia dela em todo o lado. Ficava em qualquer canto sem queixa nem choro.

- Essa menina só pára quieta!, queixava-se Sombrinha.

Deram o nome à menininha: Maria Brisa. Que ela nem vento lembrava, simples aragem.

Dona mãe ralhava, mas sem nunca fechar riso, tudo em disposições. Até que certa vez repararam em Maria Brisa. Porque a barriguinha dela crescia, parecia uma lua em estação cheia. Sombrinha ainda devaneou. Deveria ser um vazio mal digerido. Gases crescentes, arrotos tontos. Mas depois, os seios lhe incharam. E concluíram, em tremente arrepiação: a recém-nascida estava grávida!. E, de facto, nem tardaram os nove meses. Maria Brisa dava à luz e Maria Sombrinha ascendia a mãe e avó quase em mesma ocasião. Sombrinha passou a tratar de igual seus rebentinhos - a filha e a filha da filha. Uma pendendo em cada pequenino seio.

 

A crianciña nasceu, de simples escorregón, tan minusculiña que era. A menina pesaba tan nada que a mai se esquecia dela en todo o lado. Ficaba en calquer canto sen queixa nen choro.

- Esa meniña só pára quieta!, queixaba-se Sombriña.

Deron o nome á meniniña: Maria Brisa. Que ela nen vento lembraba, simples araxe/araxen.

Dona mai rallava, mais sen nunca fechar riso, tudo en disposicións. Até que certa vez repararon en Maria Brisa. Porque a barriguiña dela crescia, parecia unha lua en estación chea. Sombriña ainda devaneou. Deberia ser un vacio mal dixerido. Gases crescentes/crecentes, arrotos tontos. Mais depois, os seos/seios lle incharon. E concluíron, en tremente arrepiazón: a recén-nascida estaba grávida!. E, de facto, nen tardaron os nove meses. Maria Brisa daba á luz e Maria Sombrinha ascendia a mai e avoa case en mesma ocasión. Sombriña pasou a tratar de igual seus rebentiños - a filla e a filla da filla. Unha pendendo en cada pequeniño seo/seio.

  • -em -> -en/-e

  • Nota: arrepiação (arrepiazón/arrepiación) é unha criazón do autor que supoño significa arrepio (arrepio).

  • Nota: En portugués avô (avó) é masculino e avó (avó/avoa) feminino. Nas NOMIG(97) prescrebe-se avoa, ainda sinalando que nalgunhas partes da Galiza a pronúncia tradicional coincide coa do portugués, i.e. diferencia-se o sexo dos devanceiros mediante a abertura da vogal. En mínimos consideran-se válidas as duas formas avoa e avó, mais ao non marcar a abertura das vogais o resultado na escrita resulta un tanto confuso.

 

 

 

A família deu conta, então, do que o pai antes anunciara: Sombrinha, afinal das contas, sempre se confirmava regredindo. De dia para dia ela ia ficando sempre menorzita. Não havia que iludir - as roupas iam sobrando, o leito ia crescendo. Até que ficou do mesmo tamanho da filha. Mas não se quedou por ali. Continuou definhando a pontos de competir com a neta.

Os parentes acreditaram que ela já chegara ao mínimo mas, afinal, ainda continuava a reduzir-se. Até que ficou do mesmo tamanho de uma unha negra. A mãe, as primas, as tias a procuravam, agulha em capinzal. Encontravam-na em meio de um anónimo buraco e lhe deixavam cair uma gotícula de leite.

- Não deite de mais que ainda ela se afoga!

Até que, um dia, a menina se extinguiu, em idimensão. Sombrinha era incontemplável a vistas nuas. Choraram os familiares, sem conformidade. Como iriam ficar as duas orfãzinhas, ainda na gengivação de leite? A mãe ordenou que se fosse ao quintal e se trouxesse o esquecido pai. O velho entrou sem entender o motivo do chamamento. Mas, assim que passou a porta, ele olhou o nada e chamou, em encantado riso:

- Sombrinha, que faz você nessa poeirinha?

E depois pegou numa imperceptível luzinha e supendeu-na no vazio dos braços. Venha que eu vou cuidar de si, murmurou enquanto regressava para o quintal da casa, nas traseiras da vida.

 

A família deu conta, entón, do que o pai antes anunciara: Sombriña, afinal das contas, sempre se confirmaba regredindo. De dia para dia ela ia ficando sempre menorciña. Non habia que iludir - as roupas ian sobrando, o leito ia crescendo. Até que ficou do mesmo tamaño da filla. Mas non se quedou por ali. Continuou defiñando a pontos de competir coa neta.

Os parentes acreditaran que ela xa chegara ao mínimo mais, afinal, ainda continuaba a reducir-se. Até que ficou do mesmo tamaño de unha uña negra. A mai, as primas, as tias a procuraban, agulla en capinzal. Encontraban-na en meio dun anónimo buraco e lle deixaban cair unha gotícula de leite.

- Non deite de mais que ainda ela se afoga!

Até que, un dia, a meniña se extinguiu, en idimensión. Sombriña era incontemplábel a vistas nuas. Choraran os familiares, sen conformidade. Como irian ficar as duas orfaciñas, ainda na xenxivación de leite? A mai ordenou que se fose ao quintal e se trouxese o esquecido pai. O vello entrou sen entender o motivo do chamamento. Mais, asi que pasou a porta, el ollou o nada e chamou, en encantado riso:

- Sombriña, que fas nesa poeiriña?

E depois pegou nunha imperceptíbel luciña e supendeu-na no vacio dos brazos. Veña que eu vou cuidar de si, murmurou encuanto/encanto regresaba para o quintal da casa, nas traseiras da vida.

  • Nota: menorcita -> menorciña.

  • Nota: Capinzal: Terreo onde crescen ervas.

  • Nota: idimensão (idimensión), incontemplável (incontemplábel) e gengivação (xenxivación) son criazóns do autor.

  • Nota: O portugués orfãzinhas corresponde-se en galego con orfiñas ou orfansiñas. Teño a impresión que a primeira forma, orfiñas, usa-se nas zonas ceceantes e a segunda, orfansiñas, nas seseantes.

  • Nota: assim -> asi.

  • Nota: faz (fai) é a terceira persoa de singular do presente do verbo fazer (facer).

  • Nota: cuidar de si -> cuidar-te.


 
Prévio:  Fernando Pessoa   Superior:  Prática   Próximo:  Sobrenomes brasileiros

 

José Ramom Flores d'as Seixas25-07-2004